Monte de areia

Carta a uma amiga

Lindona,

Sei que talvez penses que ninguém te compreende, talvez te sintas sozinha e no vazio, porque quando para nós é difícil pôr por palavras o que sentimos é-nos fácil acreditar que os outros não compreenderão. Mas não é essa a realidade em que vives...

Explorando metaforicamente este momento, apresento-te o monte de areia...

Neste momento, sinto que estás debaixo dele... As situações que têm acontecido na tua vida foram abrindo um buraco enorme, dentro do qual tu entraste, mas com a tua força e esperança, continuavas a ver a luz do sol lá no cimo, e sabias que havia forma de saíres dali.

Há uns dias, houve uma tempestade, maior do que todas as outras, que tapou o buraco, onde tu ficaste, e sobre ele deixou este monte de areia. Ainda que a esperança seja menor pois já não te é possível ver a luz do sol, a tua força continua em ti (e eu sei disso), porque continuas a tentar tirar o monte de areia de cima, e pouca culpa tens de que a areia teime em escorregar para cima de ti e o trabalho que fizeste num momento rapidamente pareça ter sido em vão.

Cá em cima, na praia, junto ao monte de areia, estão dezenas de amigos a escavar o para tentar encontrar-te e ajudar-te nesta demanda (eu sou uma dessas pessoas), mas, tal como um objecto que enterramos na areia quando brincamos na praia é difícil de encontrar depois (mesmo que tenhamos assinalado o seu local com um grande e gordo X), por vezes também o nosso trabalho se torna difícil, mas não desisti-mos (pelo menos eu não). 

De facto, apenas é mais fácil se tu em baixo e nós em cima formos desmontando aquele monte de areia. Tarefa que temos feito e por isso não tarda nada e o trabalho ficará concluído. Até porque, repara bem, em redor daquele monte que te soterra, está um mundo lindo - o sol, a brisa fresca, o mar ondulante e azul (se bem que neste momento é inverno e não será exactamente assim), e as dezenas de árduos trabalhadores que te esperavam. 

Nesse momento, vais entender a força que tens, porque enquanto aquelas dezenas trabalhavam por cima, num ambiente muito melhor e ajudando-se umas às outras... o teu trabalho, vindo de baixo, mostra-se de facto mais complicado, afinal estavas sozinha ali, às escuras e sem saberes o que te esperava depois de saíres. E eu entendo que seja isto que sintas neste momento, solidão, escuridão, medo, abandono, incompreensão e dificuldade em avançar perante a imensidão de areia que tiras e a areia que volta a cair para cima de ti (aquilo que te parece dar um passo em frente e três para trás), mas isso não corresponde à realidade do mundo que te espera cá em cima, e à realidade que nós conseguimos ver.

Neste momento, pouco mais podemos fazer a não ser continuar o nosso trabalho, tu no fundo do buraco e eu na praia junto ao monte, mas uma coisa te prometo, quando finalmente estiveres também na praia vamos pegar na areia daquele monte e construir um castelo, que será somente teu.